Aniversário de Campinas

Fazenda Roseira é referência em Campinas na preservação da cultura afro-brasileira

12 de julho de 2021

Referência na preservação da cultura afro-brasileira não apenas em Campinas _uma das últimas cidades brasileiras a abolir a escravidão_, mas em todo estado de São Paulo e no país, a Casa de Cultura Fazenda Roseira – Comunidade Jongo Dito Ribeiro resiste.

Foto: reprodução – redes sociais

Fruto de uma conquista do movimento negro e do movimento popular, o casarão construído no final do século XIX se transformou em equipamento público desde 2017 e é gerido desde 2008 pela Comunidade Jongo Dito Ribeiro. A gestora cultural, historiadora, doutora em urbanismo e neta de Benedito Ribeiro, que dá nome à comunidade, Alessandra Ribeiro, destaca a importância do trabalho que é desenvolvido no local: “Toda vez que a gente tem a possibilidade de preservar uma memória, a partir da prática cultural, da ciência e de registros, é uma grande contribuição quanto identidade negra, quanto em conhecimento desses povos que continuam lidando com a ausência de direitos. E através dessa prática cultural que já é um patrimônio desde 2005, poder divulgar e difundir a memória afro da cidade de Campinas a partir da Casa de Cultura Fazenda Roseira, é muito potente”, argumenta.

A Associação do Jongo Dito Ribeiro vem articulando atividades culturais e educativas que tem como eixos a cultura, a história, a mitologia e o meio ambiente em uma perspectiva afro-brasileira. Com base na lei 10639/03, de implementação do estudo da história da África e da cultura afro-brasileira nos currículos escolares de todas as redes de ensino do país, também desenvolve atividades direcionadas para alunos da rede básica de ensino e para a formação de profissionais da educação.

Entre as diversas celebrações realizadas no local estão as tradicionais programações do Arraial Afrojulino, que fez 18 anos em 2021, mas com a festa cancelada na pandemia, e as comemorações do Mês da Consciência Negra (Novembro) “Sou África em Todos os Sentidos”, que em 2020 teve atividades virtuais e alguns eventos presenciais.

O Arraial é uma festa julina tradicionalmente realizada no segundo sábado de julho, iniciada pelo terço a São Benedito. Em 2009, o Arraial foi inserido no calendário oficial do Estado de São Paulo, dada a importância e referência do evento e a divulgação que promove da cultura afro em sua diversidade. Toda a elaboração, desenvolvimento, divulgação e organização do Arraial é realizado pela própria comunidade, unindo gerações, amigos e familiares no maior evento realizado pela sociedade civil na cidade.

Já no Mês da Consciência Negra, a entidade promove apresentações, debates, exibição de filmes e trocas de saberes entre público geral, acadêmicos e estudantes, sobre a presença negra. Devido a pandemia em 2020, diferente dos outros anos em que a comunidade recebia em sua sede o público das escolas e demais visitantes, entre crianças, idosos, universitários e outros, os encontros foram realizados virtualmente, mas os eventos de abertura, como a Marcha Zumbi dos Palmares e Roda da Mãe Preta, ocorreram de forma presencial seguindo os protocolos sanitários.

Jongo do Sudeste – patrimônio imaterial

Foto – crédito: Fabiana Ribeiro/arquivo

O Jongo é uma prática cultural composta por cantos, percussão, tambores e danças, que no passado era uma das poucas possibilidades de lazer dos negros escravizados. É considerado o precursor do samba.

Na Fazenda Roseira, a Comunidade Jongo Dito Ribeiro propaga essa atividade cultural e, no ano de 2005, o Jongo do Sudeste foi reconhecido pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) como patrimônio cultural brasileiro de natureza imaterial.

“É um patrimônio que traz lastros identitários, fortalecimento coletivo, cultura, transmissão de saberes, relações intergeracionais, respeito às nossas diversidades, e poder viver essa prática cultural com certeza é importante porque nos faz pessoas melhores e possibilita que as pessoas que nos acessem também possam ser alimentadas por essa energia positiva, por esses saberes e por essa forma de ver o mundo melhor”, comenta a gestora Alessandra Ribeiro.

Vandalismo, vulnerabilidade, intolerância

A Casa de Cultura Fazenda Roseira tem sido alvo de depredação, invasão e furto entre 2020 e começo de 2021. Vários objetos foram levados ou danificados em mais de uma ação, entre eles livros, instrumentos musicais, objetos religiosos sagrados e outros bens, o que fez com que os administradores do local registrassem boletins de ocorrência. Foram seis entre agosto de 2000 e janeiro de 2021. Também houve uma reunião com o vice-prefeito de Campinas, Wanderley de Almeida, em que foi apresentada a necessidade emergencial de implementação de um sistema segurança melhor no local, especialmente um cercamento, na avaliação da gestão.

A equipe que atua na Fazenda é quem está mantendo a vigília do espaço. A gestora Alessandra Ribeiro atrela essas invasões e furtos com vulnerabilidades sociais, dentre elas o preconceito.

“Essas invasões têm a ver com vulnerabilidades sociais, sendo uma delas o preconceito que acaba agravando essa vulnerabilidade. Preconceito tem a ver com a ignorância, com falta de compreensão da dificuldade do negro, falta de percepção das relações humanas. Então, com certeza na Fazenda Roseira, essa vulnerabilidade social, junto ao preconceito, fez parte dessas invasões que sofremos. Além de que o cenário político tão atípico, onde as intolerâncias são impostas frentes as comunidades, isso se agravou muito”, analisa.

O Campinas.com.br entrou em contato com a Prefeitura para verificar sobre possíveis medidas após as invasões. A assessoria de imprensa da secretaria de Cultura e Turismo informou que houve um contato nesta primeira semana de julho com a gestora para marcar uma reunião entre ela e a secretária da pasta, Alexandra Caprioli, para discutir o assunto, e que o encontro deve ficar para a semana do aniversário de Campinas, comemorado em 14 de julho.

Segundo Alessandra, a prioridade agora é garantir a segurança necessária para que o espaço possa continuar com seu principal objetivo, que é o reconhecimento pela cidade de Campinas para que o local possa continuar contribuindo com a cultura e com as pesquisas para levar o nome da cidade para o mundo.

Foto no alto: site da Comunidade Jongo Dito Ribeiro

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