Quando digo “Salve Glória!” – não falo de Glorias Menezes, Gloria Pires ou Gloria Maria, falo de Glória Perez. Também quando digo salve, não quero fazer uma ode, uma homenagem ou pedir proteção. Talvez eu esteja pedindo que a dramaturgia esteja salva “dela”. Nada contra a pessoa da novelista, mas sim contra sua colaboração repetitiva, inverossímil e decadente.
A autora da atual novela das vinte e uma horas da Rede Globo, não cansa de se explicar sobre a impossibilidade dos fatos de sua trama. Ela não é a única, todos os autores de novelas cometem absurdos ao ter que agradar ao público, consequentemente aos patrocinadores, a censura invisível, a critica, durante meses e meses. Não ganham pouco pra isso, então deveriam justificar melhor sua remuneração.
Sei que isso pode soar como implicância, mas quando estudamos um determinado assunto é normal que fiquemos mais exigentes com eles. Um bom roteiro logo se nota mesmo com certos buracos, falhas e alguns fatos inverossímeis devido o imediatismo que a novela pede, mais do que o cinema, devido seu tempo e agilidade.
Gloria nunca me enganou com seus exageros e artificialismos, praticamente a “Disney” das novelas, explorando romances de uma cigana com executivo, uma transplantada com o apaixonado da doadora morta, a marroquina com o brasileiro clonado, a indiana de alta casta com um tal intocável, etc. Além de suas escolhas infelizes para os pares principais, Gloria é campeã em casais que não deram certo por falta de química ou de talento de um deles, como o mais famoso caso – o cigano Igor – (Ricardo Macchi). Ou protagonistas que deixam de ser.
Para mim suas novelas sempre me poluíram a visão com uma balburdia de informações, algo assim meio “Feira de Acarí”, uma mistura de tentativas de agradar. Sua obsessão por culturas de fora virou sua marca registrada já criticada por Manoel Carlos que alegou haver tanto pra se mostrar de Brasil, ao invés de tantos cartões postais estrangeiros. Porém, este filão da autora quase sempre deu certo com “O Clone” e “Caminho das Índias” esta última que faturou um Grammy.
Já dizia Nélson Rodrigues que a unanimidade é burra, afinal, como já devo ter dito aqui, tudo o que é feito pra agradar a muitos, dificilmente deve ser bom. E o carnaval de informações de Gloria ainda sempre hasteia bandeirolas sociais, também não é a única, mas é outra de suas marcas.
Gloria Perez começou como colaboradora de Janete Clair, quando esta assumiu não conseguir mais escrever uma novela sozinha pela primeira vez devido a reincidência de um câncer. Há quem diga que Gloria é a autora brasileira que mais se parece com Janete.
Acho isso um tanto blasfêmia, mas não sei se eu gostaria das obras de Janete como gostei no passado, afinal nem tudo que foi bom ontem é bom hoje. O canal Viva é a prova disso, descobri que tem coisas que é melhor refilmar mesmo, para quem é muito visual há coisas inadmissíveis, por isso existem os clássicos, estes sim quase intocáveis.
Janete Clair, considerada a “Nossa Senhora das Oito” ou a “Usineira de Sonhos”, títulos que lhe foram dados graças aos seus louros colhidos com a fama e com certeza muito, muito, mas muito dinheiro a menos numa outra fase da TV brasileira. Janete escrevia também muito mais e às vezes perdia a verossimilhança devido os drásticos cortes da censura militar.
Por isso acho que Gloria Perez jamais poderia ser uma Nossa Senhora das Oito ou das Nove. Ela esta mais para Gloria Magadan, a cubana que com este nome artístico escrevia novelas para a Rede Globo bem nos primórdios, acumulava varias funções além de escrever, outros tempos, cedeu ao sucesso e competência de Janete e a trouxe para a mesma TV.
Janete fez tanto sucesso com um realismo que não existia levando corridas de Formula 1 na novela “Beto Rockfeller” e, sem querer, acabou jogando para escanteio as novelas fantasiosas de Gloria Magadan que mostravam um mundo de princesas, viscondes, sheiks e sabe-se mais o quê?
Gloria Perez aclamada ou não, premiada ou não, se deu melhor nas adaptações, como a da minissérie “Desejo” ou mesmo “Hilda Furacão”. Parece que assim não tira tanto os pés do chão. A novelista começou bem, sua primeira novela na íntegra tinha a parceria com Aguinaldo Silva, segundo consta, tal cumplicidade se desfez no desfecho da trama. Era “Partido Alto” que tinha tudo pra ser um sucesso, ali muitos elementos presentes em novelas da mesma. Falo de bicheiros, escola de samba, assalto, etc. e assim como das de Aguinaldo, “Duas Caras”, “Senhora do Destino” e a ótima minissérie “Bandidos da Falange”.
Ainda assim tem quem assiste e são muitos, que ainda querem conferir a miscelânea de tráfico de escravas brancas com crianças, órgãos, drogas, homens, logo vão por aves embutidas nas moças também. Seringas assassinas, e a lista de Schindler dos atores desgostosos que querem ser “Salvos de Glória”. Se você não assiste ou desistiu já está a salvo. Salve a nova teledramaturgia! Não é brinquedo não! E a pergunta que não quer calar – Vera Fischer já levantou da cadeira?
Crédito da imagem: autora de novelas Glória Perez.
Newsletter:
© 2010-2025 Todos os direitos reservados - por Ideia74