Faça as Malas

Racismo e ódio. É pra rir ou chorar?

por Marcos Craveiro
Publicado em 3 de novembro de 2015

A lei existe e foi criada há 25 anos. É a Lei 7.716, que define os crimes resultantes de preconceito racial. Ela determina pena de reclusão a quem tenha cometido ato de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Com a sanção, a lei regulamentou o trecho da Constituição Federal que torna inafiançável e imprescritível o crime de racismo, após dizer que todos são iguais sem discriminação de qualquer natureza. É determinada também a pena de quem, de modo discriminatório, recusa o acesso a estabelecimentos comerciais (um a três anos), impede que crianças se matriculem em escolas (três a cinco anos), e que cidadãos negros entrem em restaurantes, bares ou edifícios públicos ou utilizem transporte público (um a três anos). Os funcionários públicos, tratado na lei, que cometerem racismo, podem perder o cargo. Trabalhadores de empresas privadas estão sujeitos a suspensão de até três meses. As pessoas que incitarem a discriminação e o preconceito também podem ser punidas, de acordo com a lei.

A regra é clara, diria o velho árbitro, mas todo malandro racista faz cara de pintura na parede e ri. E tome racismo, vingança, inveja e safadeza. Tem racismo no nosso dia a dia em todos os lugares por onde andamos. Ele é perverso e matreiro, sempre escondido nas sombras, no canto do olhar, no sorriso de canto de boca. E, mais perigoso e perverso, no pensamento que não se lê e nem vê. Ele está lá.

Final de semana, Taís Araújo, atriz do primeiro time, foi atacada em sua página no Face. Guerreira, ela foi ao ataque: “É muito chato, em 2015, ainda ter que falar sobre isso, mas não podemos nos calar. Na última noite, recebi uma série de ataques racistas na minha página. Absolutamente tudo está registrado e será enviado à Polícia Federal. Eu não vou apagar nenhum desses comentários. Faço questão que todos sintam o mesmo que eu senti: a vergonha de ainda ter gente covarde e pequena neste país, além do sentimento de pena dessa gente tão pobre de espírito. Não vou me intimidar, tampouco abaixar a cabeça”.

A PF vai pra cima da malandragem. É só esperar pra ver a cara dos racistas, gente pobre de espírito, pra dizer o possível.

Mas é no futebol, específicamente, onde existe o racismo em sua forma mais cruel. É dentro de campo, mas hoje também nas páginas da internet onde ele aparece de forma quase “natural”, digamos. “Macaco, negro sujo, nego vagabundo, negrão, vai comer banana, seu merda”. Assim mesmo, na cara dura, os racistas travestidos de torcedores gritam no meio da torcida. Na Europa jogam bananas e imitam o som dos macacos. Aqui na América do Sul também.

Esta semana o meia são-paulino Michel Bastos foi chamado de “negro safado” em sua página do Instagram. A Injúria racial veio de um torcedor que se identifica como Nanda_cominni que escreveu: “Macaco negro safado, respeita a torcida. Otário, vagabundo, faz por merecer o dinheiro que recebe”.

Michel havia feito um gesto com o dedo na boca, mandando a torcida falar menos depois de fazer um gol no jogo contra o Sport. Chegou a se desculpar em seguida sinalizando que estava de cabeça quente. Michel Bastos disse que vai tomar todas as providências para que essa pessoa responda legalmente pelo ato de racismo.

Querido amigo que até agora leu o que eu digo neste espaço oferecido a este velho jornalista. Eu poderia estar falando de Ricardo Oliveira, o artilheiro do Brasileirão, do Corinthians e seu treinador que deveria estar na Seleção, ou do Vasco que tem tudo pra cair, mas que pode escapar. Coisas deste mundo tão emocionante do futebol.

Mas eu falei desse assunto que me enoja, deste mundo do racismo que eu não compreendo. E, não por outro motivo, que é ter consciência de que nosso país é mulato, mistura de raças que aceita com carinho e amor israelitas e árabes, muçulmanos, sírios, ingleses, alemães e americanos. Índios se misturaram a essas raças todas e negros fizeram a argamassa do que hoje pode se chamar de “a mulatada brasileira”, linda e alegre. Musical e fagueira.

Eu não sou branco, sou mistura de negros, alemães, espanhóis e italianos. Tenho um filho e uma filha brancos totalmente e dois morenos como eu. Não dá pra explicar, não sou médico. Sou jornalista, sou do rock e vi Santana tocar na minha frente. Sou fã de Steely Dan e cobri para a TV dois concertos dos tenores Pavaroti, Carreras e Plácido Domingo a quem entrevistei. Mas eu também já entrevistei Cartola, Mano Décio e Zeca Pagodinho. Gil e Gal. Pelé e Garrincha. Joguei uma pelada com Nilton Santos em Brasília e depois fui na casa dele tomar uma geladinha e ouvir histórias da bola.

Eu, sinceramente, não entendo racismo. Quem pratica pode sofrer sanções aqui nesta terra de expiações, mas vai ser cobrado do outro lado. Se vai.

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