Pensar Psicanalítico

O meu outono – Uma reflexão sobre ciclos de transformação pessoal

por Vagner Couto
Publicado em 22 de março de 2024

Vivo o influxo da força da gravidade que incide sobre os meus anos e sentimentos e, atraído por mim mesmo, recolho-me ao esforço de mais reverência ao ser que sou – eu – que aqui me centro, orbito e habito.

Vim ao mundo como uma dessas primaveras de encantos infantes, onde a vida mostra seu regozijo colorido, perfumado e multiforme ao pleno, ao farto e ao fértil, mas foi num verão mesmo que nasci – estação de luz do verbo ver – com o qual verei, vi e vejo a ação virtuosa da vida ao meu tempo, modo e lugar, pelos quais cheguei aqui: atravessei as estações da minha estrada de ferro de flor e calor, cumpri as baldeações – e cresci e amadureci.

Colho meus frutos, nessa estação das frutas forjadas ao sol e aos elementos. Faço minha a colheita que é minha mesma, e nela tem os frutos plenos de vigor e cor, maduros, saborosos e suculentos, como também tem os frutos visitados e bicados por passarinhos de infindas espécies: andorinha, sabiá, cotovia, bem-te-vi, sanhaço, rouxinol, lavadeira, canário – pois eles também têm a sua colheita, e é nossa essa colheita.

Colho meus frutos – e são eles impregnados da vitalidade das sementes que plantei, da dormência que lhes quebrei, do cuidado que lhes dediquei. E são, também, impregnados da graça divina que a tudo cobre, nutre e dá sentido – ela, sim, o húmus que determina o sal e o sabor do meu suor.

Colho meus frutos – minhas amoras e caquis, e minhas jacas e abacaxis. Colho meus frutos, meus cereais e meus ais, singulares e plurais, e colho meus risos e contentamentos.

Sinto o sol e o tempo em mim, e dispo-me das folhas secas de verdades e certezas que não são mais, que compõem o substrato composto que nutre a minha transformação, dedicando-as à vida onde estou e sou. Desta forma, também me nutro de mim mesmo, e cresço pelo que abro mão, desapego… – aceitando um novo sentir e um novo olhar, quando o que é velho e morto, o que não mais serve à minha evolução, possa de mim se desprender.

A conquista do outono já percorre o meu ser há longos anos. Cada vez mais desprovido das folhas secas do supérfluo, do efêmero e do superficial, me afirmo ante o necessário e essencial, já profundamente plantados em mim por ancestralidades ainda indecifráveis. O que é de dentro cresce e ocupa seu lugar. O que é do infinito cresce e revela seus quasares e seus pulsares. Com essa pulsação, o ritmo serena, os anseios serenam e a essência emerge com seu rastro dourado iluminando as sombras abissais que a nada permitia entender.

Imagens, inspirações, sonhos e intuições passam a ter mais significado. Fico mais suscetível à serenidade e à presença de uma verdade que não precisa ser provada a ninguém. Fico mais suscetível a uma beleza que, percebo, sempre esteve aqui. E a uma força que pulsa em tudo, em todos e em todo lugar. Algo de espiritual transcende minha compreensão pensante sobre o que é o espiritual, e sinto.

Lampejos de consciência abdicam das respostas já sabidas e empedradas, e elaboram perguntas novas, nascentes, cristalinas. Amparado por uma outra sensibilidade, experimento veios de coisas que já lhes ouvi o nome: autenticidade, liberdade, responsabilidade, profundidade, sinceridade, fraternidade, intimidade…

Lampejos que inspiram recolhimento, pra favorecer o encontro comigo mesmo, num processo de percepção mais direto de como a vida funciona em mim, o que requer de mim e o que oferece a mim pra elaboração de um ser mais verdadeiramente maduro, apto a uma nova expressão e a um novo viver.

Momento de revelação, de trazer à tona o que estava sendo omitido ou reprimido. De ouvir o que precisa ser ouvido, de falar o que precisa ser falado e de ver o que precisa ser visto. Deixando que o mundo interno revele o que está escondido atrás de angústias, medos e decepções. Momento de escutar e honrar a mim mesmo nesse momento de retorno para dentro, de reflexão, pra compreender e fazer os lutos necessários pra fechar ciclos e continuar, mais uma vez – em novo ciclo, os passos no caminho.

Outono que, alinhado com a lua minguante, tem movimento descendente da superfície ao profundo, ao âmago, à essência, tal como o movimento da seiva das plantas em direção às suas raízes – em preparação à lua nova. E as folhas da árvore da vida que antes eram verdes, douram, avermelham, amarelam e reluzem, pra então esvair em sua morte ocres, sépia, terrosas… – e verter ao solo, secas, onde se dissolverão, transmutarão e integrarão. E assim o ser, o ente – frente ao inverno que inevitavelmente virá – fica pronto pra renascer e recomeçar, com um novo jeito, em um novo brotar. Que florescerá, ainda, muitas e muitas primaveras.

 

COMO LIDAR COM TUDO ISSO? 

Psicanálise, terapia, autoconhecimento – algo assim.

Para falar particularmente com o autor, use: 19 99760 0201 [zap] ou vagnercouto1@gmail.com

https://www.facebook.com/vagner.couto.9678

 

Vagner Couto, psicanalista, com especialização em Psicoterapia Psicanalítica Breve, aperfeiçoamento em Psicoterapia Psicanalítica de Casais e formação em Psicoterapia Energética Corporal, tem mais de 40 anos de vivência em instituição dedicada ao autoconhecimento, à expansão da consciência e à espiritualidade. Poeta e escritor, é autor de “Documento sobre a colheita do algodão”, “Admirável momento novo”, “A estrela da manhã” e outros escritos. Jardineiro, ama cultivar pessoas e cuidar delas.

 

 

Compartilhe

Newsletter:

© 2010-2025 Todos os direitos reservados - por Ideia74