(…) continuamos perdidos no tempo, esse outro labirinto.
Jorge Luís Borges, O Labirinto (1984).
Na mitologia grega, um labirinto foi construído na ilha de Creta para aprisionar o Minotauro, criatura metade homem, metade cavalo, que aterrorizava a cidade exigindo o sacrifício de sete rapazes e sete donzelas para apaziguar a sua fúria. Diante deste fato, o jovem Teseu se voluntaria para matar o Minotauro. Chegando à Creta, Teseu se apaixona pela filha do rei Minos, Ariadne, que lhe dá uma espada para matar o Minotauro e um novelo de linha para que consiga demarcar o caminho e retornar em segurança. Como é amplamente conhecido, Teseu vence o Minotauro e liberta Creta dessa maldição.
O filme “Maze Runner” (2014) se apropria dessa mitologia e a traduz em um filme que se passa em um mundo distópico, no qual um imenso labirinto ameaça jovens que procuram sobreviver da melhor maneira possível com os perigos advindos dessa “construção”.
Baseado na trilogia literária homônima, do autor James Dashner, “Maze Runner” utiliza a figura mítica do labirinto como a principal metáfora do rito de passagem da infância/adolescência para a idade adulta, fazendo um uso interessante desse labirinto que tanto nos assombra. Pode parecer um pouco óbvia essa analogia, mas a forma como isso é feita acaba nos proporcionando bons momentos em uma aventura que parece um episódio longo da série “Lost” (e isso é um elogio).
Nas grandes apostas das franquias teens que pretendem se tornar as substitutas naturais de “Harry Potter” e/ou “Crepúsculo” no imaginário adolescente, “Maze Runner” ganha alguns pontos de vantagem da série “Divergente”, mas perde em complexidade quando comparada a “Jogos Vorazes”. O que as três (“Maze”, “Divergente” e “Jogos”) mantêm em comum é a utilização desse mundo distópico no qual o poder é controlado e resta a um pequeno grupo (no caso os jovens/adolescentes) rebelar-se contra a tirania ditatorial dos governos existentes em cada planeta/país.
Para que exista o labirinto é necessário um “monstro”, seja ele um político, um cientista, um governante, etc. Os jovens que aqui se encontram em um lugar chamado “Clareira” são circundados por esse imenso labirinto no qual apenas os corredores (os maze runners do título) podem adentra-lo durante o dia, pois à noite as portas se fecham e quem fica lá dentro com certeza não sairá vivo. O labirinto é o percurso que precisa ser explorado e vencido, apesar de todas as dificuldades inerentes a essa empreitada, para que se chegue a “glória” (matar o Minotauro).
Enquanto permanecem seguros na Clareira, e não precisam enfrentar os perigos do labirinto, permanecem crianças/adolescentes, sem saber os mistérios que os aguardam do outro lado. A Clareira funciona como uma espécie de porto seguro idílico, assim como a infância, em uma clara alusão a semelhança desses garotos com a trupe dos garotos perdidos de Peter Pan, que não queriam crescer na Terra do Nunca. Cabe ao novato Thomas (Teseu?) rebelar-se contra essas regras e encarar o labirinto de frente. A glória final da libertação desse labirinto é o enfrentamento dos mistérios da vida em um rito de passagem no qual nem todos conseguem chegar ao fim. Entrar no labirinto é deixar a inocência de lado e aventurar-se em um mundo desconhecido (o mundo adulto) onde as regras não são tão claras para quem inicia essa travessia. Quem nele entra ou aventura-se nunca sai o mesmo.
É sintomático também que a última criança/adolescente a subir para a Clareira seja uma menina, Teresa (Ariadne?). O contato com o sexo oposto causa certo alvoroço e desconforto entre os meninos, deixando-os em desconfiança, da mesma maneira que desconfiam de Thomas, que não se permite acomodar em mundo de facilidades e quer aventurar-se em novas descobertas, mesmo que para isso seja necessário enfrentar o desconhecido. Thomas e Teresa possuem um passado em comum, do qual nos é dado pouca explicação, talvez garantido maior participação da personagem nas continuações posteriores.
Sem trazer nada de novo, com alguns clichês e “furos” no roteiro, “Maze Runner” ainda consegue ser uma boa opção de diversão, com uma narrativa cheia de tensão em seu início, com poucas explicações, deixando que tudo seja resolvido em sua conclusão (ainda que termine de forma “aberta” para sua posterior continuação), instigando a curiosidade do público para que siga acompanhando os desdobramentos dessa saga. Nos segundos finais do filme conseguimos vislumbrar o inimigo a quem eles devem temer (o Minotauro?), que nesse mundo no qual eles habitam (Creta?), só terá a paz instaurada quando for possível vencê-lo. A saída do labirinto é apenas o início dessa “viagem” de aprendizagem.
Veja o trailer:
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