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“Batman vs Superman: a origem da justiça” ou a origem do desapontamento

por Luiz Andreghetto
Publicado em 6 de abril de 2016

Na atual conjuntura todos já sabem que, mesmo com um incrível sucesso de bilheteria, Batman vs Superman: a origem da justiça (2016) tem recebido críticas em sua maioria negativas ou que demonstram os vários “deslizes” cometidos pela obra.

De um lado fãs fervorosos tentam defender o filme e do outro lado temos uma parcela de espectadores que apenas foram ao cinema ver mais um filme de super-heróis, alguns gostaram outros nem tanto. Nessa dicotomia entre os que defendem e os que atacam o filme, percebemos uma polarização que muito lembra a situação política de um determinado país. “Marvel boys” se incomodam com o “peso” dramático, a falta de alívios cômicos e/ou personagens mais empáticos, enquanto os “DC boys” defendem que o realismo exacerbado que vem impregnado nessas obras é uma característica da DC Comics. Não vou aqui discutir sobre as diferenças de contexto do surgimento das duas editoras de HQs e nem o porquê cada uma, a seu modo, impregnou suas obras com diferenças de estilo, cores, personagens, narratividade, etc. O que pretendo fazer aqui é analisar BvsS como obra cinematográfica e sua construção autônoma, mesmo sendo baseada em HQs que a precede.

Dentro do universo de uma cinematografia de ação, BvsS até surpreende pelas cenas orquestradas, utilizando o que de melhor existe de efeitos especiais e sonoros, construindo um filme que, em alguns momentos, chega perto da empolgação (a participação da Mulher-Maravilha é um deles). Na verdade, são nesses parcos momentos de empolgação que o filme deveria decolar, mas acontece justamente o contrário.

E o maior culpado de tudo isso é o diretor Zack Snyder. Pode parecer leviano demais ter que escolher apenas um nome para levar toda a culpa relacionada aos equívocos perpetuados pelo filme, ainda mais sabendo que a estrutura de realização de uma produção dessa magnitude tenha “mil” pessoas envolvidas, com produtores (aqueles que botam o dinheiro pra valer nessas obras) que apenas querem saber de lucro financeiro, mesmo que pra isso as questões artísticas sejam relegados ao segundo plano. Mas, como “mentor” do projeto e que anteriormente já havia dirigido O Homem de Aço (que, convenhamos, é um filme também muito equivocado), Snyder não parece ser a escolha certa para a pretensão que a DC tem em relação à criação de um universo cinematográfico, assim como o criado por sua maior concorrente. Diferente da Marvel que começou vagarosamente a expandir seu universo de personagens, a DC tenta correr atrás do prejuízo, pulando várias etapas e tentando alcançar esse déficit todo com apenas um filme.

(Aqui começam os spoilers, caso ainda não tenha visto, volte depois para ler).

Isso fica evidente na tela com um roteiro esquemático demais, que “atropela” algumas passagens (a luta entre os dois super-heróis, o “projeto” de Lex Luthor) e repete outras desnecessariamente (todo mundo já está cansado de saber como os pais do Batman morrem), não desenvolvendo seus personagens de forma satisfatória em relação às suas motivações pessoais (Batman mais parece um garoto mimado e cabeça dura que ficou com raiva do Superman e quer se vingar a qualquer custo do que alguém capaz de discernir no que essa luta implicaria), sem contar o motivo principal que faz com que os dois heróis parem de brigar, que, de tão estúpido, rapidamente virou meme na internet. Também não fica claro porque Lex Luthor tanto quer que os dois se odeiem ou qual é o seu grande plano (coisa que todo vilão que se preze tem um, mesmo que seja “apenas” dominar o mundo) quando coloca Zod para ser ressuscitado e o transforma em Apocalipse. Anticlimático, o filme alonga-se demasiadamente em seu final, sem mostrar nenhum tipo de novidade.

Alguns podem alegar que essas e tantas outras respostas estão nas HQs, mas nós não estamos lendo essas histórias em quadrinhos, estamos vendo um filme que tem por obrigação contar uma história da melhor maneira possível e fazê-la ser crível até para quem nunca ouviu falar na DC. Não se constrói filmes apenas para fãs ou iniciados, principalmente quando se trata de uma produção com milhões de dólares envolvidos e com a qual se coloca em jogo o futuro da DC Comics no cinema.

Mas, voltando ao Zack Snyder e sua má escolha como diretor do filme, Snyder se leva a sério demais e, como fã incondicional desse universo da DC, exagera na dramaticidade que envolve a narrativa de BvsS. O excesso de realismo (para o bem ou para o mau Christopher Nolan foi quem sedimentou isso com Batman Begins) faz com que momentos simples e banais ganhem o peso de uma tragédia shakespeariana, como se cada momento desses personagens fossem uma grande reflexão filosófica, profundidade essa que não existe no roteiro.

Nesse paradoxo entre o que as imagens mostram e o que está sendo dito enterra-se toda a credibilidade que poderia advir desse embate tão grandioso entre Batman e Superman, entre um “quase” psicopata social e seus truques tecnológicos e um alienígena indestrutível que ama a raça humana mais do que qualquer terráqueo. O tom sombrio, as cores acinzentadas e esse excesso de realismo faz com que o Superman pareça um mero convidado especial em um filme do Batman, reduzindo Lois Lane a uma participação sem conflito que serve apenas para juntar, forçosamente, as peças para o tão famigerado final.

Nesse duelo, quem sai perdendo somos nós que somos privados de ver uma obra intensa e complexa como esses dois personagens merecem. Só nos resta torcer para que Snyder tenha um pouco de bom senso e não transforme A Liga da Justiça em mais um emaranhado de situações desconexas ou  decida, de uma vez por todas, não mais dirigir nenhum filme de super-heróis, conforme a petição on-line que circula na internet solicitando seu afastamento das próximas continuações. Parece que o duelo agora é fora das telas.

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