“Paixão” foi uma das palavras que António Saramago mais repetiu durante a apresentação dos vinhos que levam seu nome, ontem, na Associação Brasileira de Sommeliers – Campinas. Ele trouxe da Península de Setúbal, Portugal, cinco rótulos de sua premiadíssima vinícola. Em quase duas horas de apaixonada explanação, deixou que a emoção ocupasse lugar ao lado das explicações técnicas, necessárias para compreender a sua assinatura na história da enologia portuguesa.
António José Ribeiro Saramago nasceu em Vila Nogueira de Azeitão, em 1948. A paixão pelo vinho que ele tanto expressa veio do pai, José Maria Saramago, adegueiro da famosa vinícola José Maria da Fonseca. E foi nesta empresa, que o convidado da noite iniciou-se na enologia. É bem provável que a maioria dos brasileiros já o conheça daí, talvez nos anos 70/80, quando as exportações ainda eram escassas no País. Quem não curtiu o vinho Periquita, presença quase obrigatória na época da Páscoa? Pois é, Saramago lembrou dos milhões e milhões de litros desse vinho que saíam de Portugal, rumo a mercados do mundo inteiro, inclusive do Brasil.
Ele desenvolveu uma longa carreira na José Maria da Fonseca. Foram mais de quatro décadas. Agradecido, lembra da preciosa oportunidade de estudar na Faculdade de Enologia da Université Victor Segalen – Bordeaux, experiência que o colocou no nível mais elevado do vinho. A essa altura, já estava formado o profissional sentimental que define a bebida como uma equação de “50% realização da natureza e 50% trabalho do enólogo tentando não estragar o que a natureza já fez.”
A natureza no caso é a Península de Setúbal, que compreende duas denominações de origem (Palmela e Setúbal) e a designação Vinho Regional Península de Setúbal. A casta Castelão, que é exatamente nossa velha conhecida Periquita, reina absoluta nessa região. E é a única que Saramago utiliza em “monovarietais”. Na noite, ofereceu orgulhoso o António Saramago Winemaker 2013, acolhido como um dos momentos máximos da degustação. E aqui ficamos sabendo que “saramago” é nome de enólogo, de escritor e também de uma florzinha de quatro pétalas, bastante comum em Portugal. Ela está representada no selo que enfeita o rótulo desse vinho. A região tem ainda as uvas brancas Arinto, Fernão Pires e Moscatel de Setúbal (do dulcíssimo vinho licoroso de mesmo nome); e as tintas Alicante Bouschet, Cabernet Sauvignon, Moscatel Roxo e Syrah.
Exibindo um quê de atualidade, o enólogo conta que gosta mesmo de elaborar blend, ou vinho de corte ou assemblage. E diz: “Meu trabalho é desenhar vinhos.” Usa o carvalho com parcimônia, embora seja habilidoso também em promover o amadurecimento do vinho com a madeira. Como um bom hóspede, não se esqueceu de elogiar o produto brasileiro. “Os espumantes estão em nível de excelência dos grandes produtores mundiais”. E ele sabe o que está falando, já que é consultor da Villaggio Grando – Boutique Winery, de Santa Catarina. E vale dizer que Saramago tem muitos compromissos no Brasil, como demonstra a imagem acima, em que ele comanda um evento na ABS-São Paulo. Aos 69 anos, o “desenhista” revela uma certa emoção lusitana ao vislumbrar o futuro. “Vou pedir ao tempo que me dê mais tempo”, diz, citando a canção O Tempo Não Para, da fadista moderna Mariza. É uma pista de que ele ainda tem muitas realizações pela frente. Saúde!
Vamos à degustação*
Risco Branco 2015: Uvas Arinto e Fernão Pires. Vinho de cor palha, com reflexos verdeais. Muito fresco, alta acidez, elegante. Agradável mineralidade, cada vez mais nítida na taça. Fácil de gostar. Lembra muito o francês Sancerre. Álcool: 13%. R$ 80,75.
Risco Tinto 2013: 100% Castelão. Cor rubi, com reflexos violáceos. Presença marcante de framboesa, amora e outras frutas vermelhas frescas. Excelente acidez, taninos agradáveis. Profundo e persistente na boca. Sem passagem em carvalho. Longevidade de seis anos. Álcool: 13,5%. R$ 80,75.
Risco Reserva: Uvas Alicante Bouschet, Castelão, Cabernet Sauvignon, Trincadeira. Cor rubi, com toques violáceos. Aromas de frutas maduras e geleias vermelhas. Taninos presentes e agradáveis. A “estrangeira” Cabernet Sauvignon entre as castas portuguesas deu um toque original ao vinho, que estagiou em carvalho francês e americano por seis meses. Longevidade prevista de 7 anos. Álcool: 14%. R$ 127,00.
António Saramago Winemaker 2013: 100% Castelão. Vinho comemorativo aos 50 anos de enologia de António Saramago. Acentuada cor rubi. Notas de frutas escuras maduras e geleia. Elegante, profundo e complexo na boca, com taninos gentis e alta acidez. Sem passagem em carvalho. Longevidade prevista de 6 anos. Álcool: 14,5%. R$ 150,00.
Dúvida 2008: Uvas Aragonês, Trincadeira e Grand Noir. É o vinho mais premiado de António Saramago e está entre os melhores de Portugal. Cor intensa, muito fechada. Aroma marcante de ameixa preta, notas de baunilha, possivelmente herdadas do estágio de 24 meses em carvalho francês e americano. Álcool: 15%. R$ 810,00.
* Os vinhos António Saramago são importados pela Viníssimo, f. (11) 4195-5554, Em Campinas, você os encontra na Excelência Vinhos, f. (19) 3294-9594 / 3254-2501
Newsletter:
© 2010-2025 Todos os direitos reservados - por Ideia74