Vários são os filmes que tratam da trajetória romântica de um casal, desde o primeiro dia em que se encontram até os obstáculos que precisam enfrentar para que o relacionamento perdure.
“A teoria de tudo” (2014) quase consegue não ser mais um, entre tantos outros filmes dessa temática, ao contar a história de amor entre o físico Stephen Hawking e sua primeira esposa Jane. Baseado no livro escrito por ela, Travelling to Infinity: My Life with Stephen, “A teoria de tudo” envereda pelo dia-a-dia do casal e como Jane lida com a doença de Stephen, que tem o corpo paralisado por uma esclerose lateral amiotrófica, doença degenerativa que costuma ser fatal.
Um dos mais célebres físicos da atualidade, quase uma celebridade pop, Stephen Hawking, um especialista em cosmologia (estudo da origem e da evolução do Universo) e sua doença degenerativa é uma figura por si só extremamente reconhecível, mas o fio condutor do roteiro pouco está preocupado com os questionamentos dos estudos proferidos por Hawking. Ainda que leve no título uma teoria a qual Hawking vem há tempos perseguindo, a tal teoria do tudo, o filme opta por dar ênfase ao romance entre Stephen e Jane e o quanto a doença se insere na vida desse jovem casal e as prováveis consequências que advêm dessa situação.
Uma aposta que, comercialmente, mostra-se certeira, mas reduz o filme a um mero entretenimento sem grandes doses de ousadia ou criatividade, conseguindo chegar ao ponto de quase ignorar o momento mais auspicioso dessa história: o triângulo amoroso formado por Stephen, Jane e um rapaz que se torna uma espécie de “cuidador” de Hawking. Se não fosse tão puritano, o filme poderia inserir uma interessante discussão a cerca das responsabilidades de Jane, seus desejos e o quanto Stephen, imobilizado em uma cadeira de rodas, seria capaz de ceder por amar essa mulher. Mas tudo é mostrado da forma mais discreta possível, sem manchar a honra dos envolvidos.
Outro grande problema da produção é a forma extremamente acadêmica que o diretor James Marsh (ganhador do Oscar de melhor documentário de 2009 por O equilibrista) conduz a narrativa, edulcorada através de uma belíssima fotografia que nada tem a dizer, sendo apenas um agradável deleite para os olhos daquele que está assistindo, podendo assim aceitar mais facilmente a “feiura” das dores de Stephen.
Com isso o filme se apoia incondicionalmente na química e na atuação dos dois atores principais: Eddie Redmayne e Felicity Jones, pouco conhecidos do grande público. Redmayne, que faz Hawking, é uma grata surpresa em um papel difícil que poderia facilmente resvalar para caricatura, interpretando um personagem ainda vivo, o que potencializa os problemas de um filme biográfico. Sua interpretação, reconhecida com o prêmio de Melhor Ator no Oscar de 2015, é o que salva “A teoria de tudo” da mesmice. Seu trabalho, muito comparado ao do ator Daniel Day-Lewis no filme Meu pé esquerdo, é o que impulsiona a narrativa e as personagens que ficam orbitando ao seu redor. Redmayne faz dos silêncios, da falta de movimento, de uma expressão perdida no horizonte o potencializador de sua companheira de elenco. Felicity tem nesse amparo de Redmayne uma interpretação correta e extremamente carismática. Ambos mereciam um filme melhor, pelo menos um que fizesse juz a essas personagens e a vida complexa de cada uma delas, principalmente Stephen Hawking, que vê sua vida reduzida a meia dúzia de problemas domésticos. Um autor/homem/personagem envolvido em uma busca tão grandiosa merecia um filme que demonstrasse um pouco menos de certezas, explorando um confronto maior entre ciência e religião, duas angustias tantas vezes formuladas por Hawking.
Mas, ao apostar no relacionamento de Stephen e Jane como força motriz da história, sem ter a coragem de enveredar pelos dilemas sexuais e afetivos perpassados pelo casal, “A teoria de tudo” se torna apenas um filme qualquer como tantos outros romances feitos para chorar.
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