Pensar Psicanalítico

A (in) sensibilidade nossa de cada dia – Ou: de como se esvai a saúde mental “sem que se perceba”

por Vagner Couto
Publicado em 17 de outubro de 2022

Ante às tantas certezas do nosso mundo, hoje eu tenho perguntas.

Quantas coisas não enxergamos mais – de tanto que as vemos – como se a cada olhar uma película se assentasse sobre nossa retina e, camada por camada, criasse uma casca qual uma crosta de corais encobre uma pedra exposta às arrebentações à beira-mar?

Quantas coisas não escutamos mais – tão cruas e densas e repetitivas nos parecem essas falas – eloquentes, gritantes, doloridas, acumuladas qual cera em nossos ouvidos – ecoando no silêncio de nossa surdez?

Quantas coisas acomodamos, ignoramos, calamos, emudecemos e perdemos a voz? Quantas coisas travamos e petrificamos como dores que não sabemos canalizar ou dissolver? Quantas agressões engolimos?

Quantas pessoas pensamos que as conhecemos sem nunca as ter verdadeiramente ouvido? Quantas ruas tão cheias de gente cruzamos vazias como se nada ou ninguém mais houvesse? Quantas vezes fechamos o vidro do carro, ou nossos olhos, a um necessitado que se aproxima? Quantas vezes ignoramos a pessoa porque sua roupa não simboliza aquilo que projetamos?

Quanto e quanto e quanto caminhamos pra chegar a lugar nenhum – e quanto e quanto e quanto batalhamos pra permanecer na mesma rota repetitiva, repetitiva, repetitiva…?

Quanto medo podemos sentir sem desmontar? Quanta dúvida podemos sentir sem nos perder? Quanta solidão conseguimos encarar sem distorcer ou degenerar de que estamos sós?

Quanto tempo perdemos nesse afã de não perder tempo, nessa pressa de fazer de tudo pra aproveitar o tempo – e não termos mais nem mesmo o tempo?

Quantas coisas temos carregado que não são nossas, quantas dores temos sentido que é só um infindável melindre?

Quanta memória podemos reter? Quanta atenção podemos prestar? Quanto préstimo pode nossa atenção realizar? Quanto conforto pode a nossa atenção trazer?

Quantas pausas nós temos feito, quantos respiros profundos temos dado, quantas calmas profundas temos experimentado?

O quanto temos escolhido os próprios pensamentos que queremos ter? E quanto sentido temos encontrado em tudo que fazemos?

Quantas derrotas podemos sublimar, entender, aceitar, encontrar o seu lugar? Quantos fracassos podemos acolher, quantas desistências podemos reelaborar, quantos erros podemos acertar, quantos graus podemos evoluir?

Quantos eus (des) conhecemos em nós próprios, esses personagens com quem nos identificamos, que achamos que os somos – com suas individualidades, personalidades, caracteres, singularidades – e que nem sempre expressam os nossos melhores modos de ser? Quem somos nós, egos? Quem somos nós, espíritos?

Quanta rejeição sabemos transformar em tijolos? Quanto nossa mania de limpeza coaduna com nosso íntimo? O quanto de nossa obediência tem a ver com consciência? Quanto sabemos o que precisamos pra encontrar o que ou quem queremos?

Quanto nos temos atendido na escuta da voz que clama no mais profundo deserto de nós mesmos, a pérola preciosa que emerge da dor profunda em nosso coração? O que estamos entendendo do que clama esta voz?

Quanto temos nos ligado, nos conectado e nos buscado no luminoso, no claro, positivo… cósmico… alto astral… superior? O quanto temos investido nisso – soltando… largando… desapegando… transformando?

Quantos verdadeiros diálogos, quantas verdadeiras conversas, quantos verdadeiros encontros temos tido com as nossas pessoas queridas?

Quantos olhares temos voltado ao belo?

O quanto nos dedicamos à transformação tão necessária à evolução?

E o quanto mais de perguntas caberiam aqui?

Com tudo isso, ainda fazemos que não entendemos muito bem porque estamos precisando de mais saúde mental. Mas, francamente, não tem pra onde fugir: precisamos marcar um encontro com nós mesmos.

> Como lidar com tudo isso? Psicanálise, terapia, autoconhecimento – algo assim.

 

Para falar com Vagner Couto, psicanalista, use:    19 99760 0201 [zap]. Para enviar seu comentário sobre este texto, use: vagnercouto1@gmail.com

O autor é assessor acadêmico do Cefas, Escola de Psicanálise, e membro da Clínica Cefas de Atendimento Psicanalítico. Formado em Psicanálise, tem especializações em Psicoterapia Psicanalítica Breve e em Psicoterapia Psicanalítica de Casal, Família e Grupo – em curso. Atende presencialmente na Clínica Terzis, em Campinas, ou de forma on-line para todo o Brasil. Tem profunda vivência em práticas holísticas de saúde mental em instituições como Instituto Eneasat, Laboratório de Práticas Dialógicas e Brahma Kumaris. Tem 27 anos de experiência como conselheiro em instituição dedicada ao autoconhecimento, à expansão da consciência e à espiritualidade. Já criou e coordenou a realização de mais de 70 simpósios e outros eventos psicanalíticos e na área de saúde mental junto a instituições como Associação Brasileira de Psicoterapia Analítica de Grupo, Núcleo de Estudos Psicológicos da Unicamp e Sociedade Psicanalítica de Campinas. Nesse ambiente, já trabalhou com alguns dos maiores especialistas do país: Gaiarsa, Marta Suplicy, Rubem Alves, Maria Helena Matarazzo, Paulo Gaudêncio, Vera Lamanno, Antonio Muniz de Rezende, Durval Cecchinato e Roosevelt Cassorla, entre outros. Poeta e escritor, é autor dos livros “Admirável momento novo” e “A estrela da manhã”.  Jardineiro, ama plantar árvores e cuidar delas.

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