Dia das Mães está chegando, período em que recebo muitos pedidos de sugestões de vinhos para presentear ou compartilhar no almoço em família. Vou tentar reproduzir aqui o que eu diria ao meu filho, que tem 14 anos e já faz muitas perguntas sobre vinho. Vamos lá: se você está partindo do zero, ou seja, não tem nada em mente, a primeira providência é recorrer ao sommelier da loja, expor seu objetivo e pedir ideias a ele (vamos combinar que não dá para comprar vinho decente na vendinha da esquina, certo?). Mas, atenção, tem que ter postura ao abordar o profissional. Se você simplesmente disser que quer dar uma garrafa bacana para a sua mãe, pois ela gosta de vinho, o cara vai baixar todos os “vinhos docinhos, fraquinhos, que parecem suco de uva”. Recuse, deixando transparecer sutilmente um ar contrariado, porém sem perder a classe. Algo assim: “Não, não, não… Mamis conhece vinhos.” Basta isso para ele desconfiar que não está falando com leigos.
E tem que ser mais enfático: “Moço, eu quero dar um vinho de presente para minha mãe, pois ela gosta muito de vinho. Muito mesmo. Gosta mais de vinho do que do filho dela, que, por acaso, é filho único” (brincadeira, tá!?). Aí, sim, o atendente vai interpretar corretamente o recado e pensar duas vezes antes de subestimar a habilidade das mães em apreciar néctares complexos, taninos provocantes e acidez de estalar a língua. Melhorou muito, mas aí pode surgir um inconveniente que precisa ser debelado imediatamente. O vendedor vai cair na tentação de pinçar da seção dedicada à França aquela garrafa que só poucos herdeiros conseguem adquirir sem decretar falência no dia seguinte. Não, não, não…
Assuma a sua carinha de mesada e/ou estagiário em primeiro emprego e informe que não deve ser um rótulo muito caro, porque este a própria homenageada escolhe. O truque aqui é pronunciar com convicção senhas como “original”, “países novos”, “uvas diferentes”, “terroirs emergentes”, “enólogo moderno”, “microclima brasileiro”, “biodinâmico”, “natural” … Assim por diante. Captou o espírito? Impressionar com vinho é muito mais garimpar novidades do que apostar nos consagrados. Até porque os vinhos consagrados geram elevadas expectativas e podem se revelar previsíveis na taça. Não vamos por esse caminho.
Por outro lado, se a opção for pela criatividade e não pelo valor medido em cifrões, o vinho pode até não ser dos melhores, mas com certeza trará informação, curiosidade e ricos comentários assim que chegar à mesa. Eu sei… eu sei… é ótimo ganhar um vinho de uma grande safra, daqueles com alta pontuação na The Wine Advocate, mas estes requerem uma certa cerimônia para ser apreciado plenamente. Sim, estou falando das técnicas de degustação que são corriqueiras entre iniciados, porém inibem iniciantes. Lembre-se que a ocasião pede festa, afeto e emoção e não conversa criptografada sobre aroma, acidez e retrogosto.
Por falar em The Wine Advocate, não se impressione com as iniciais RP (Robert Parker) e JR (Jancis Robinson) na hora de escolher a bebida do segundo domingo de maio. Essas letras costumam “decorar” garrafas que cravaram notas acima de 90 pontos na avaliação dos aclamados críticos. Tudo bem, são avais úteis e relativamente seguros da qualidade do vinho. Mas notas altas RP e JR quase sempre equivalem a preços altos e nem sempre a satisfação alta. Aliás, você pode estar comprando um vinho da mesma vinícola, do mesmo ano e das mesmas uvas que Parker julgou, mas não é o mesmo vinho, certo? Da vinícola até a sua mesa, cada garrafa vive uma saga diferente. Transporte e armazenagem, por exemplo, se não forem feitos corretamente, alteram as características do vinho. Anote isso.
E aí vem mais uma pergunta comum: espumantes e rosés são boas pedidas para presentear as mães? Sim, desde você não esteja os considerando como meras “bebidas de mulherzinha”. Aliás, isso não existe (repita comigo: não existe vinho de mulherzinha; esta expressão é pejorativa, falsa e inadequada). Há várias categorias desses vinhos e isso pode ser uma virtude ou um problema. Virtude porque é possível optar por um rótulo que combine com o seu bolso ou estilo de preferência, preservando a qualidaded. Problema porque eles são onipresentes em todas as festas em família, coquetéis, formatura, casamento etc… etc… o que os tornam comuns demais para quem busca um presente especial. No entanto, tê-los em mãos para compartilhar sem frescura ou compromisso é uma iniciativa bem-vinda e simpática. Mesmo porque vamos precisar de uma bebida vistosa para brinde do Dia das Mães, concorda? Espumantes e rosés são perfeitos para isso. Geladinhos sempre, não se esqueça. Saúde!
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