Blog do Chef Mané

Dona Cida, a croqueteira

por Manuel Alves Filho
Publicado em 9 de março de 2017

Dona Cida era uma negra retinta. Tinha lábios volumosos, ancas avantajadas, olhos arregalados e luzidios e andar lento. Não sei como eram seus cabelos, pois estavam sempre protegidos por um lenço acinzentado. Tinha mãos grandes, adequadas ao preparo dos volumosos croquetes que vendia diante da escola. Os bolinhos, que se apresentavam crocantes por fora e cremosos por dentro, eram mantidos quentes em uma cesta de vime forrada com panos de prato, que ela sempre trazia nos braços.

Pensando bem, dona Cida era a versão adulta – e genuinamente brasileira – da figura de Chapeuzinho Vermelho, com a vantagem de que não tinha que enfrentar nenhum Lobo Mau. Em compensação, tinha que dar conta do apetite da criançada que saía faminta da aula no final da tarde. Eu era uma delas. Gostava especialmente daquele croquete porque, diferentemente da maioria, ele tinha grande quantidade de cheiro verde na massa. E ficava ainda melhor acompanhando do molho de pimenta caseiro, que levava mais vinagre e extrato de tomate que outros ingredientes.

De vez em quando, dona Cida era auxiliada pelo filho, Cido. Auto-homenagem, provavelmente. De tanto acompanhar a mãe na lida, o garoto acabou ganhando a alcunha de “Cido Bolinho”. Ele não gostava do apelido, mas codinome é assim mesmo: quanto maior a resistência, mais ele pespega. Ainda hoje, quando vou comer um croquete, me pego comparando o pitéu com o que a dona Cida fazia. Quase sempre, o dela vence o confronto. Afinal, pouca coisa pode superar uma saborosa memória de infância.

Foto: Ronei Thezolin

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