Grande vencedor do Oscar de Melhor Filme de 2016, Spotlight – segredos revelados (2015) é um filme à moda antiga, desconectado de seu tempo, emulando um passado de repórteres/heróis típico dos anos 1970. Sua referência maior, a quem tenta retratar/homenagear, é o clássico Todos os homens do presidente (1976), com Dustin Hoffman e Robert Redford, interpretando os repórteres que descobriram o que ficou conhecido como o caso Watergate e teve como consequência a queda do presidente Richard Nixon.
Spotlight é o nome da equipe de repórteres do jornal The Boston Globe, que são direcionados às investigações especiais que demandam maior tempo de apuração dos fatos, com entrevistas, pesquisas, etc. Essa equipe se torna responsável por trazer à tona décadas de abusos sexuais e pedofilia praticados por padres e acobertados pela arquidiocese de Boston, cidade com forte presença católica nos Estados Unidos. Baseado em uma história real, ganhadora do prêmio Pulitzer, Spotlight investe muito mais em sua estrutura clássica saudosista, uma ode ao jornalismo impresso antes do advento das mídias sociais (o filme se passa em 2001) do que em realizar uma obra realmente envolvente em sua construção dramática.
Ainda que aborde um tema tão polêmico como a pedofilia (que talvez esteja um pouco desgastada pelo excesso de exposição midiática) Spotlight prima por ser um exercício de frieza na condução de sua narrativa. A paixão dos jornalistas, retratada em cena na condução de uma descoberta que se demonstra tão atroz, nunca é passada para o espectador (com exceção do personagem, do sempre excelente, Mark Ruffalo).
A direção de Tom McCarthy insiste em um tom discreto, deixando sua figura de realizador quase imperceptível, com poucos movimentos de câmera, planos simples, problemas de ritmo, sem ápices dramáticos/narrativos e uma frieza que incomoda pelo tamanho da dramaticidade que a descoberta exige. Talvez McCarthy acredite que a força da história contada justifique esse distanciamento e essa anti-dramaticidade do longa, mas acaba ocorrendo um efeito contrário: seu medo de intervir na história com uma direção mais vigorosa transforma Spotlight em um filme que poderia ser uma excelente minissérie ou um telefilme eficiente, principalmente se fosse uma produção da HBO, deixando a desejar quando se trata de uma produção mainstream produzida por um grande estúdio.
Diretor egresso do cinema indie americano, McCarthy mostra um interesse maior por personagens à margem do social ou que não se adaptam facilmente ao local que estão (seja por problemas físicos, geográficos ou psicológicos). Foi assim no delicado O agente da estação (2003), auspiciosa estreia que continuou com o interessantíssimo O Visitante (2007) e o simpático Ganhar ou perder – a vida é um jogo (2011). Posteriormente McCarthy aceita dirigir um filme para o comediante Adam Sandler, o lamentável Trocando os pés (2014). Mesmo que Spotlight seja um filme no qual não conseguimos vislumbrar toda a capacidade da mise en scene de McCarthy, ainda é gratificante que não mais o vejamos servindo de mero “operário padrão” para um astro decadente de comédias tolas.
Na ânsia de um retorno/homenagem a um cinema setentista, outrora sempre bem feito pelas mãos dos competentes Alan J. Pakula, Sidney Pollack e Sidney Lumet, Spotlight contrapõe a velha mídia com o novo jornalismo que dá claros sinais de cansaço, implorando por reinventar-se como profissão.
Como obra cinematográfica que almeja ser, Spotlight é uma excelente reportagem sobre os bastidores da noticia, mas, talvez, se fosse um documentário, conseguiria empolgar um pouco mais.
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