Entrelinhas

O cheiro do artilheiro

por Tattiane Marques e Fernanda Junqueira
Publicado em 12 de janeiro de 2016

Mês passado eu entrevistei Rivaldo, que já levou um título de “Melhor do Mundo da FIFA” em 99. O assunto era a vida dele, fatos da vida na verdade. Momentos como a fase da infância classe média bem média, com dificuldade. Peladeiro, o pai viu na bola dele um futuro e não abandonou o filho no sonho. Incentivou, bancou e o levou a peneiras e treinos. Rivaldo virou astro, menino do Santa Cruz, e, depois de uma Copa São Paulo de Futebol Junior, ele veio para o Mogi pelo olhar certeiro de Oswaldo Alvarez, o Vadão, então treinador do que seria o Carrossel Caipira, apelido do simpático time de Mogi Mirim.

No meio da entrevista eu perguntei sobre o momento que os três astros-jogadores sobem no palco para finalmente ouvirem o nome do vencedor. Do que vai levar a Bola de Ouro que representa o reencontro do menino com seu sonho de ser o melhor do mundo da bola. Claro, como não ter esse sonho? Aquele momento único, solitário ao extremo, de fazer suar anos e anos de treino duro, lances geniais, gols maravilhosos, dribles, enfim, ser o melhor dos melhores. Eu queria saber o que sente um jogador nessa pressão. Queria extrair dele o que se passa na cabeça dos caras naquela hora.

Caí da cadeira literalmente com a resposta. Ele disse tranquilo, sem titubear: “Eu já sabia que ia vencer, é tudo combinado antes. No ano seguinte eu sabia que seria o Zidane. Maradona, nos bastidores, disse na cara dele, Zidane, que eu era melhor, que jogava mais que ele.” Diante disso, e do que todos nós, imprensa e vocês que neste momento perdem tempo lendo isso que eu escrevo, pensamos que ele tá certo, que nós já desconfiávamos de tudo.

Agora, as cinco vezes em que Messi levou o título, você teve dúvida de que ele era o melhor do mundo? Eu não. Então, fazendo uma análise menos dura, digamos, devemos acreditar que sim, os patrocinadores mandam, mas não são burros. Os três melhores estavam no palco neste ano, como estiveram ano passado, e por aí vai.

Neymar merecia ser o segundo? Eu também acho, como acredito que o ano que vem, se ele continuar jogando somente o que sabemos que ele joga, leva de barbada. Tem um futebol moleque como o de Messi e está maduro. É páreo duro.

Mudando de prêmio, vamos para Wendell Lira, o atacante do gol mais bonito. Desbancou Messi e o italiano Alessandro Florenzi, da Roma. Messi fez um golaço, ao estilo dele, e de Diego Maradona. Foi levando, ninguém derrubou e ele foi pra rede. Alessandro Florenzi mandou um canudo da intermediária pela esquerda, a bola subiu, desceu e matou o goleirão. Também gol de placa. Wendell fez seu gol vitorioso de meio voleio e meia bicicleta, pura criatividade numa hora em que o jogador tem que decidir. Arrisco e faço merda? E se eu errar? Tomo vaia. Arrisco e acerto? Como vou fazer? E a bola já lá no alto, vindo em direção a ele. É um momento pra quem sabe realmente e tem coragem. E ele matou o lance com criatividade e coragem.

Como disse no agradecimento citando a história bíblica de Davi e Golias, “quando o povo viu Golias aparecer, todos disseram que ele era grande, que não tinha como vencer. E Davi falou que ele era grande, não tinha como errar”.

O resto do discurso é agradecimento ao paitrocínio, mãetrocinio, amigos, esposa e filhos e blábláblá.

O que interessa é Davi e Golias, a bola pelo ar, voando em direção a ele e a coragem de executar o que ninguém faria naquela hora. O super gol, o mais bonito do ano, gol de valer taça – que ele ganhou – e de impulsionar a carreira. Tomara que ele continue a fazer gols, o cheiro de artilheiro ele tem.

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