Consoantes Reticentes…

O dia em que meu Deus saiu de férias – e não voltou nunca mais

por Marcelo Sguassábia
Publicado em 30 de agosto de 2012

Desde que me conheço por gente, os signos do zodíaco sempre fizeram parte de um universo estranho para mim. Dentre as prováveis razões, insisto em culpar o excesso de espiritualidade da minha família, nas diversas manifestações de benzedeiras, espíritos e seres fantasmagóricos que pairam no imaginário do interiorano, que me moldou a uma visão mais cética, crítica e palpável do que há entre o céu e a terra. Na busca por não parecer alienado, como eu os julgava (preconceituosamente), passei a atribuir todos os significados da minha vida a uma simples equação física: a lei da ação e conseqüência. O destino, troquei pelo acaso. À providência divina, me pareceu mais adequado chamar de coincidência, ou sorte. Os acertos imprevistos da ciência médica tomaram o lugar dos milagres. As orações foram substituídas pelo pensamento positivo. Até o “amém”pós espirro foi substituído por um incrédulo “obrigado”.

Assim, “do contra”convicto, fui me tornando um “quase ateu”(ou seja, um ateu que ainda não tem coragem de dizer publicamente – principalmente perto da mãe – que não acredita mais em Deus – ou que talvez nunca acreditou). É natural, portanto, que eu não consiga entender como a posição de um planeta no dia em que eu nasci possa determinar minha personalidade, uma vez que tantas pessoas que também nasceram neste dia sejam tão diferentes de mim. Este é apenas um dos argumentos para que eu ignore as páginas de horóscopo dos jornais ou fique totalmente fora da rodinha quando o assunto é compatibilidade de personalidades e signos.

O mais engraçado de tudo isso é quando atribuem meu comportamento incrédulo ao fato de eu ser virginiano. Eu já sou bem grandinho pra entender que o que me tornou o que eu sou hoje foi uma série de fatores ambientais durante a infância, conjugados a meu interesse pela ciência e à carga genética, e não o dia e a hora em que aquele bebê que fui, que não sabia fazer nada além de chorar e fazer cocô o dia inteiro, nasceu. É um pouco ilógico pensar em personalidade nata, uma vez que a ciência já provou que a consolidação de traços de comportamento se dá apenas por volta dos sete anos. Além disso, não quero ser rotulado como um tipo pré-definido de pessoa. Temos diversos estímulos e mudamos tanto ao longo da vida que para mim soaria um pouco ingênuo se eu acreditasse que eu sou assim e mais nada. Afinal, eu me pareço tão complexo para mim mesmo!

Sendo assim, agir de forma “típica”de um determinado signo deveria não segmentar as pessoas em 12 grupos comportamentais, mas sim enquadrá-las na categoria de seres humanos, ou seja, passíveis de mudanças de humor e donas de personalidades complexas. A hilária solução encontrada pelos seguidores dos astros para argumentar contra o que exponho acima são os signos ascendentes, com angulação das luas e presença dos quatro elementos fundamentais. É tanta patacoada junta que fica até difícil acreditar no enorme número de pessoas que perdem tempo se informando como devem agir na semana seguinte, mesmo sabendo que quem inventa toda aquela baboseira é um jornalista criativo que já encerrou todas as pautas do dia e não tem mais nada pra fazer.

Mensagem para o leitor: “Não tenho nada a ver com a vida alheia, portanto faça o que bem entender dela, mesmo que isso signifique entregar suas decisões e sua visão de mundo a um modelo arbitrário e inventado a milhões de anos por quem não tinha nem a novela das oito para se distrair. Só peço que não me incluam em conversas sobre astrologia. Os signos não são pré-requisitos para nada em minha vida, além de representarem um grande retrocesso ao avanço científico. Muito obrigado pela compreensão”.

 Guilherme, o virginiano.

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