Liquidificultura

“Campinas – The Walking Dead – O Retorno”

por César Póvero
Publicado em 12 de dezembro de 2011

Abro as cortinas e revolvo a cova do passado. Ainda falo de nossa cultura morta/viva ou viva/morta “zombie” que rasteja agonizante, fragmentos dilacerados ficam pelo caminho, isso nos assusta – pelo menos pra quem ainda se importa. A poeira do descaso bizarro dos governantes campineiros com a cultura da cidade não está só refletida opacamente nos teatros espaços físicos, que foram abandonados ou mal cuidados nos últimos mandatos, vai muito mais além – ou além túmulo. Coloco a pá na terra e escavo mais alguns corpos…

Se fizéssemos uma viagem no tempo e sobrevoássemos Campinas e passássemos pelo centro, entre a Rua Treze de Maio e a Rua Costa Aguiar em 1.850, avistaríamos o teto da Catedral de Campinas e logo o Teatro São Carlos. Construído exatamente em 1850 quando a produção do café começava a se destacar. Porém, em 1922, o Teatro São Carlos pareceu pequeno para “alguns” e inadequado ao porte da cidade, sendo assim caiu, como um cenário que é trocado para ceder lugar a outra cena, outro teatro. E eu pergunto, por que não manter aquele ali e construir outro em novo local?

O Teatro Municipal foi inaugurado em 10 de setembro de 1930 com 1.300 lugares, escadarias, corredores, adornos com pó de ouro16. Cinco anos após sua inauguração, os jornais já criticavam “sua” administração. No início dos anos 60, passa a ser chamado Teatro Municipal Carlos Gomes, a imprensa apontava infiltrações e rachaduras. Em 1965, baseado em laudos técnicos de “conteúdo polêmico”, o prefeito Ruy Novaes, apoiado pela maioria dos vereadores, decidiu demolir repentinamente “um pouco” da história de Campinas, da nossa história.

Parte significativa da população não se sentiu satisfeita com as explicações dadas pela Prefeitura, ou pelo prefeito Ruy Novaes. Diferentes versões para o fato são dadas em uma série de vinte e dois depoimentos que estão no livro “Fragmentos de uma demolição: História Oral do Teatro Municipal Carlos Gomes”. O terreno onde ficava o Teatro, tornou-se estacionamento. Logo após, ali foi construída a loja C&A. Cheguei a ler no “Correio Popular”, a intenção do falecido prefeito Antonio da Costa Santos, na época de seu mandato, com um projeto de revitalização do centro, construiria um Teatro Municipal dentro do Viaduto Miguel Vicente Cury, ali nos anos 70 existia uma bela praça que ocupava todo o quarteirão, com jardim, lago com patos e um relógio de sol, um cartão postal sucumbido, onde hoje existe aquele terminal envolto por uma pseudo-favela que cresceu a olhos vistos.

Em blogs que resgatam a memória de Campinas, há campineiros natos que clamam por um “Municipal” digno do que foi perdido e não algo em linhas modernas. Hoje quem passa por ali, pode apreciar um “teatro de rua de mau gosto”, um cenário de ofertas das lojas que estão no lugar de outros belos prédios históricos destruídos, e os dramas encenados são: mendicância, prostituição entre outros, envolvidos pela fragrância de urina. Mas devemos aplaudir nossos governantes? O atual, por exemplo? Sim, afinal nós NÃO temos um Teatro Municipal, mas SIM temos um Terminal Rodoviário, não mais aquele com fachada que nunca ficou pronta – algo semelhante ao cemitério nunca inaugurado da Sucupira de Dias Gomes – mais parecia uma ruína, me lembrava o Coliseu de Roma! Ainda deixo as covas e cortinas abertas para mais mortos que caminharem em cena…

Um verdadeiro inventário de fotos da época, de várias construções de Campinas podem ser conferidas nos endereços abaixo, inclusive o Teatro Municipal de Campinas em várias imagens, inclusive em ruínas.

http://www.getuliogrigoletto.cng.br/teatrodemolicao.htm

http://pro-memoria-de-campinas-sp.blogspot.com/2007/07/descaso-com-histria-teatro-municipal.html

http://arqtiagoliveira.blogspot.com/2010/05/arquitetura-qual-o-preco-do-progresso.html

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